segunda-feira, 15 de março de 2010

1000 Faces em uma Cara


O relógio desperta, algo estranho no ar, são 6:30 da manhã de um belo dia, um horário ótimo de se acordar. Ele levanta, lava o rosto, com um olhar esquisito, a água a escorrer por sua face, de gota em gota, um novo arrepio, medo, pavor e tristeza. Olha para o espelho, não se conhece mais, não vê mais o interior de si próprio, o seu eu, a pessoa que ele sempre desejou, ele e mais nada. Levanta da pia com o rosto ainda molhado, vai a até a toalha e o enxuga, uma toalha verde que se torna amarela após ter sugado a água, ele volta para o espelho, sua face já mudou, a expressão não é mais a mesma, logo sua agonia retorna, agora mais um longo arrepio, o medo percorre suas veias, uma lagrima cai, molhando seu rosto novamente. Se sente incapacitado, esta querendo ressurgir em sua vida e não consegue, a dor começa, mais lágrimas caem de seu rosto, novamente ele pega toalha, com tantas lagrimas que já esta toda em tom amarelado. Não consegue se olhar no espelho, sua face parece estar zombando dele. Entra no chuveiro aflito, gotas caem sobre seu corpo, lhe proporcionando imensa dor, água vem e vai, contorna-o e cai no ralo agonizando seus pesadelos. No reflexo do vidro do Box, vê seu rosto novamente, isto o deixa perturbado, sem saber por quê. Saindo do banho, novamente outra toalha, azul claro, ficando azul escuro a cada vez que passa em si. O espelho lhe incomoda outra vez, outra face, ele enxerga apenas um olho de onde esta. Um olho, nada mais, fica observando-o, pensa no seu futuro, passado e esquece-se do presente. Alguém bate a porta, estão a sua procura, quem pode estar na sua casa uma hora dessas? Batendo em sua porta, insistentemente, barulhos, socos, ponta pés e silencio. Parece ter ido embora, lentamente vai até o trinque, que reflete outra face sua, o medo. Vê-se branco no reflexo do trinque, seu coração acelera, vira a chave com cautela, observa seu quarto.

A cama desarrumada do mesmo jeito, algumas roupas jogadas, que ele teria atirado elas ao chão quando foi ao banheiro, a janela aberta, como ele deixou. Tudo em ordem, mas quem teria batido a porta? Na cabeceira da cama, outro espelho, dele enxerga a porta, o corredor, a mesa da cozinha e mais uma face, mais uma de suas tantas. Saindo do banheiro lentamente, ouve barulhos, alguma coisa ronda a sua casa, passa por baixo de sua janela, um vulto, um reflexo e suor. Começa a suar frio, calafrios, arrepios, seus ossos parecem estar fracos e as pernas moles. Observa um reflexo na janela, é apenas ele no quarto, porem a única coisa que vê é sua face, suor, olhos arregalados e dentes batendo. Sente o sangue gelado, nervosismo, suas mãos tremem. Lentamente caminha até seu guarda-roupa, como se estivesse movendo uma pena, abre-o, sem fazer barulho. Observa seu interior, vai se vestir rapidamente. Novos barulhos, pelo reflexo da cama, vê algo na cozinha. Apavorado pega suas roupas, sem escolher peça a peça, como costuma fazer todos os dias. Veste-as como um soldado veste seu uniforme na guerra, mas não é uma guerra, ou é? Uma guerra dele com o desconhecido.

Caminhando até a porta do quarto, tenta chavear-la sem sucesso, suas mãos tremem e fica sem condições de virar a chave. Algo força a porta, o trinque sobe e desce várias vezes, pela fresta da porta que esta sendo forçada entra uma mão, vê seus olhos no reflexo do relógio, escuros e lacrimejando. Com toda sua força empurra a porta, mas não esta tendo sucesso, a mão o agarra, segura-o bruscamente pelo braço, ele grita por socorro, ninguém o responde, ele esta sozinho. A batalha continua vida ou morte, azar ou sorte. Não agüenta mais, vai ceder, a porta já esta quase aberta, junta suas ultimas forças, tenta reagir, porem não consegue. A porta abre com a força que o jogou no chão, do chão ele vê quem abriu a porta. Agora tudo faz sentido, ele reconhece as roupas, os sapatos e o que mais refletia o relógio. Olhando seu espelho no teto, vê suas faces, todas elas em uma só cara. Está frente a frente consigo mesmo. Suas ilusões acabam, o relógio desperta, algo estranho no ar, são 6:30 da manhã de um belo dia, um horário ótimo de se acordar.

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